Rotundando
sexta-feira, 17 de setembro de 2021
Quase
terça-feira, 15 de novembro de 2011
Os pés na terra
Despeço-me dos sonhos,
como quem assiste à partida
de um grande amor,
imposta p'la razão de ser das coisas
e não pelos desígnios de uma vontade,
de um peito que respira ar alheio.
Despeço-me dos sonhos,
sonhos do longe do sempre,
excedendo a própria vida.
Toupeiras na pele,
subterrâneas,
fazendo girar motores antigos
fumegando odores que lembram
ruminam.
Sonhos soçobrando
no sopro da cedência
incómodo
mal digerido
sussurando ao ouvido,
baixinho baixinho...
Setembro 2011
quinta-feira, 6 de outubro de 2011
Respiro
Agosto 2011
domingo, 4 de setembro de 2011
Uma folha
Uma folha na copa de uma árvore
tão verde como as outras
bem irmanada nervuras afins:
nem muito bruta
nem parada nos pormenores.
Apenas a felicidade
do tom acastanhado de Outono
quando o sol do céu se desprende,
o riso de cócegas soltas
sempre que o vento sai à rua agitado,
e a queda pela força da chuva
sem a vertigem de o fazer sozinha.
Depois volta,
com as flores os pássaros
verde viçosa
espirrando o pólen
num lenço emprestado.
A seiva diluindo-se, correndo -
a imposição de se expandir,
tocar, ser tocada
tão profundamente,
sem reparar.
Gostava de ser uma folha
assim
eu e todas as outras
folha como as outras
na copa farta de uma árvore.
Julho 2011
segunda-feira, 1 de agosto de 2011
Gota de luz
Amar-te com quantas forças tenho
e as mãos, minhas,
rompendo grandes a terra
p'ra te agarrar amparar,
olhar para ti
olhos diluídos
no mesmo sangue na mesma carne;
e a calma das nuvens roçando teu sono,
paisagem que esquece o cansaço,
algodão doce desfazendo-se
em lábios de cereja molhada.
Quero-te demasiado,
e demasiada a zanga
p'ra aceitar a aridez,
o futuro por concretizar.
Somam-se os dias
escavando o vazio;
a faca torcendo retorcendo
o que faço por esquecer.
Busco apenas um sentido,
o melhor deles,
e tantos por aqui passam passaram,
p'ra entreter o tempo
disfarçá-lo
enquanto não vens,
pequena gota de luz.
Junho 2011
sábado, 2 de julho de 2011
Dia de sol
Hoje cedo o sol brilhou,
seus raios de areia quente
numa pele final de tarde
que a brisa beija, arrepia.
Fechei os olhos...
O presente alastrou-se...
Fui corpo, calor, redenção,
nas veias correndo a seu tempo, devagar.
O descanso sacudiu-me inteira.
Larguei os braços as pernas
e entreguei-me à cadeira sempre pronta,
acolhendo-me as formas herdadas,
e as outras,
de quem cede ao apetite nocturno.
Lá longe o anjo da noite,
a muito custo voando,
esbracejando rente ao chão.
Consigo a mala da zanga,
o sangue correndo chumbo,
e nem um dente,
branco.
Lá longe a dúvida a pergunta
forçando a vida a outro ritmo,
e o tempo fugindo em fio grosso.
Não sei quando o pano irá correr,
nem tão pouco se irei bater palmas.
Mas o sol brilha em arco-íris
na gota que cai e se escoa em mil saídas:
a vida, o espaço, a possibilidade.
Abri a porta da rua,
e cá dentro um bocadinho
disponível para amar.
Maio 2011
segunda-feira, 30 de maio de 2011
Azul
O azul do mar brincando nas ondas.
A vida as flores.
O azul criança que anoitece
na segurança de uma banda-desenhada.
O azul ganga da juventude que fica,
resistente.
O azul largo de um horizonte que me coloca no mundo.
O azul de um céu esperançado de estrelas.
O azul transparente de uma piscina
nadando livre leve.
O azul húmido que enternece as paredes de minha casa.
O azul ruminante dos sonhos que não alcancei.
O azul escuro após o jantar
inquieto, de tão sozinho.
O azul vórtice no estômago,
de quando não consigo falar.
O azul cinzento
subtraído à dor.
O azul das lágrimas dificilmente partilhadas.
O azul perdido,
de quando partiste.
O azul colo dos olhos de minha mãe.
O azul
a que tantas vezes renunciei
e que me pertence,
reconheço-me nele
amadurecido p'lo tempo
outra textura:
a da sinceridade,
minha,
a pouco e pouco.
Março/Abril 2011